MPF vê "promoção política" e dá parecer por multa a governador

Procuradora eleitoral Cristina Nascimento de Melo também é a favor de suspensão do programa

MPF: parecer favorável à representação contra o governador Pedro Taques



A procuradora eleitoral Cristina Nascimento de Melo deu parecer favorável a uma representação do PDT que pede a suspensão do projeto Caravana da Transformação e multa ao governador Pedro Taques (PSDB) pela prática de conduta vedada pela legislação eleitoral.



Na representação, o PDT alega que o chefe do Executivo Estadual tem usado o projeto para fazer promoção pessoal, já que é candidato à reeleição.



De acordo com o PDT, o governador tem feito “distribuição gratuita de bens e benefícios em pleno exercício eleitoral”, o que é proibido pela legislação, além de inexistir lei que autorizasse a realização do programa social, tampouco execução orçamentária no ano anterior.



Promoção política



Em seu parecer, a procuradora afirmou que o artigo 73, IV, da Lei n. 9.504/97, proíbe uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de

distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público.



Conforme Cristina de Melo, esses serviços, no ano em que se realiza a eleição, só podem ocorrer em casos de calamidade pública, estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.


Esse o contexto, não é possível permitir que a distribuição gratuita de bens e serviços seja utilizada para obtenção de apoio político, afetando o equilíbrio da disputa eleitoral

A procuradora afirmou que a Caravana da Transformação não se encaixa em nenhum desses itens, uma vez que inexiste lei que autoriza a realização do programa. Atualmente, o projeto está em vigor, por meio de um decreto do próprio governador.



“A situação dos autos não se enquadra em nenhum permissivo legal disciplinado na parte final do art. 73, § 10 da Lei nº 9.504/97, pois o projeto não ocorreu em caso de calamidade pública, estado de emergência nem foi programa social autorizado em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior”, afirmou.



“A alegação dos requeridos de que seria desnecessário lei para tal programa, já que versa sobre serviços comuns a cada pasta, apenas prestados de forma itinerante, facilitando o acesso da população aos serviços ofertados pela Administração Municipal, não convence”, disse.



A procuradora destacou que somente nesse período eleitoral já foram realizadas três edições do programa "maculando" a normalidade e legitimidade do pleito.



“Esse o contexto, não é possível permitir que a distribuição gratuita de bens e serviços seja utilizada para obtenção de apoio político, afetando o equilíbrio da disputa eleitoral”, disse.



Cristina Melo ressaltou que a vedação não é relativa à distribuição dos bens e serviços à população, “mas sim o desvirtuamento da sua finalidade estritamente assistencial”.



“O evento não passava despercebido. Na verdade, o que se quis foi usar do programa para fazer promoção política. Rememora-se, ainda, que o próprio art. 73 da Lei das Eleições prescreve que são condutas vedadas porque ‘tendentes’ a afetar a igualdade entre os candidatos, ou seja, presume-se que tais condutas, efetivamente, inclinam-se a desigualar os candidatos, sendo despicienda a prova da potencialidade da conduta na lisura do pleito”.



A procuradora então se manifestou pela procedência da representação, opinando pela aplicação de multa ao governador, uma vez que foi provada a prática de conduta vedada.



“Por todo o exposto, conclui-se que houve violação ao disposto no art. 73, § 10 da Lei nº 9.504/97, motivo pelo qual a Representação deve ser julgada procedente,



inclusive com a incidência da multa prevista no § 4º do mesmo artigo de lei”, pontuou.



Leia o parecer na íntegra:



Trata-se de REPRESENTAÇÃO POR CONDUTA VEDADA A AGENTES PÚBLICOS, ajuizada pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT/MT em face de JOSÉ PEDRO GONÇALVES TAQUES, com pedido de liminar, objetivando a suspensão da “Caravana da Transformação” realizada pelo Governo do Estado de Mato Grosso e, no mérito, a fixação de multa em desfavor do Representado, sem prejuízo da pena de cassação a ser pleiteada em momento próprio (após solicitação do registro de candidatura).

Conforme a inicial, ID 17945 - 17946, o representante alega a existência da prática de conduta vedada pelo Chefe do Executivo Estadual, consistente na distribuição gratuita de bens e benefícios em pleno exercício eleitoral. Afirma que inexiste lei autorizativa para a realização do programa social e que não houve execução orçamentária no exercício anterior, portanto, o programa contraria o disposto no art. 73, inciso IV, §10 da Lei n. 9.504/97. Sustenta, outrossim, que houve promoção pessoal em favor do précandidato ora Representado.



A decisão (ID 17997) indeferiu a reunião desta Representação com a Representação n. 0600232-21.2018.6.11.0000, por não reconhecer a conexão entre ambas as representações, bem como negou a tutela de urgência requerida, tendo em vista que o evento já havia iniciado e as consequências práticas a serem suportadas pela população destinatária dos serviços ofertados com a sua interrupção abrupta. O Representado apresentou contestação requerendo a improcedência da Representação (ID 18651 - 18652). Vieram os autos para manifestação.



É o relatório. 2. DO MÉRITO 2.1 – DA CONFIGURAÇÃO DA CONDUTA VEDADA O representante requer seja provida a Representação que versa sobre a conduta vedada praticada mediante a distribuição gratuita de bens e serviços, através da realização do programa social “Caravana da Transformação”, em afronta ao disposto no art. 73, IV e §10 da Lei n. 9.504/97. Pois bem, o referido dispositivo, veda o uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público. Além disso, veda a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, no ano em que se realizar eleição, com exceção dos casos de calamidade pública, estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. Observa-se que o dispositivo ressalva as hipóteses legais em que poderão ser distribuídos bens, valores ou benefícios pela Administração Pública em ano eleitoral, são elas: a) casos de calamidade pública; b) estado de emergência; ou c) programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. O descumprimento de tal normativa acarreta a suspensão imediata da conduta, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa de cinco a cem mil UFIR (art. 73, §4º, Lei n. 9.504/97).



Portanto, estabelecida a premissa legal, cabe considerar que no caso em tela restou incontroverso que foram realizados projetos sociais, com distribuição de bens e serviços. O projeto social denominado “Caravana da Transformação” foi lançado no ano de 2016, instituído pelo Decreto n. 408, de 22 de janeiro de 2016, tendo sido realizadas várias edições do projeto em diversos municípios do Estado, e ofertados bens e serviços como procedimentos de oftalmologia, exames de DNA, assistência jurídica, a emissão de documentos, curso de corte de cabelo e design de sobrancelhas, sorteio de mudas ornamentais e frutíferas, entre outros. Portanto, inexiste lei autorizativa para a realização do supramencionado programa. O que houve foi a sua instituição por Decreto, fundamentada em situação emergencial e que não foi alterada tendo se passado mais de 2 (dois) anos. É inegável que houve distribuição gratuita de bens e serviços por parte da Administração Pública, do mesmo modo, é inegável que se deu em pleno ano de eleição.



Ao contrário do que faz entender o requerido, a legislação eleitoral não se presta a engessar injustificadamente a Administração Pública, obstando que programas sociais importantes sejam implementados pelo gestor em ano eleitoral. Reitera-se que as vedações no ano do pleito impostas pela Lei nº 9.504/97, ao proibir a prática de determinadas condutas, objetiva a igualdade entre os candidatos às eleições, restringindo, com isso, a malversação da máquina pública administrativa em prol de determinado candidato e o abuso de poder político ou de autoridade, protegendo a lisura do certame. Conforme se depreende dos autos, foram realizadas várias edições do projeto social em diversos municípios do Estado. Imperioso destacar que no presente ano eleitoral já foram realizadas 03 edições. Esse o contexto, não é possível permitir que a distribuição gratuita de bens e serviços seja utilizada para obtenção de apoio político, afetando o equilíbrio da disputa eleitoral. Vale notar que a situação dos autos não se enquadra em nenhum permissivo legal disciplinado na parte final do art. 73, § 10 da Lei nº 9.504/97, pois o projeto não ocorreu em caso de calamidade pública, estado de emergência nem foi programa social autorizado em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. O comando normativo supracitado exige que o programa social tenha sido autorizado por lei, dando ênfase à necessidade de estrita observância ao princípio da legalidade pelo administrador público, sendo indispensável, como assevera Rodrigo Zílio que "o programa social esteja fundamentado por norma jurídica específica, elaborada em conformidade com o procedimento legislativo."1 (grifamos) Ademais, para a configuração da conduta vedada em questão basta a prática do ato ilícito, sendo desnecessário demonstrar seu caráter eleitoreiro, promoção pessoal ou potencial lesivo, conforme pacífica jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: RECURSO ESPECIAL. ART. 73, §11, DA LEI Nº 9.504/97.



REPASSES FINANCEIROS. ENTIDADE VINCULADA. CANDIDATO. LEI AUTORIZATIVA. FATO OCORRIDO ANTES DO PERÍODO ELEITORAL. IRRELEVÂNCIA. CONDUTA VEDADA. CARACTERIZAÇÃO. PROVIMENTO. 1. As condutas do art. 73 da Lei nº 9.504/97 se configuram com a mera prática dos atos, os quais, por presunção legal, são tendentes a afetar a isonomia entre os candidatos. 2. Repasses financeiros realizados por prefeito a entidade vinculada a candidato caracterizam a vedação prevista no §11 do art. 73 da Lei das Eleições. 3. A citada norma é clara ao estipular como período vedado todo o ano eleitoral, daí concluir-se que a vedação abrange, inclusive, atos praticados antes dos requerimentos de registro. 4. Esta Corte já decidiu que a vedação de que trata o §11 do art. 73 da Lei nº 9.504/97 tem caráter absoluto e proíbe, no ano da eleição, a execução por entidade vinculada nominalmente a candidato ou por ele mantida de qualquer programa social da Administração, incluindo os autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. Precedente. 5. Recurso especial provido. (Recurso Especial Eleitoral n. 39306, relatado no TSE pela Ministra Luciana Christina Guimarães Lóssio, acórdão publicado no Diário de Justiça de 13 de junho de 2016). (Grifamos)



Conforme já mencionado, inexiste lei autorizativa para a realização do supramencionado programa. A alegação dos requeridos de que seria desnecessário lei para tal programa, já que versa sobre serviços comuns a cada pasta, apenas prestados de forma itinerante, facilitando o acesso da população aos serviços ofertados pela Administração Municipal, não convence. Consoante as provas coligidas aos autos demonstram a distribuição de bens serviços sem autorizativo legal específico. Aliás, a distribuição de bens e serviços é fato incontroverso. Inconteste a distribuição de bens e serviços também ressoa inquestionável, ao contrário do que afirmam os recorridos, somente a existência cumulativa de lei de criação do programa social e de previsão orçamentária específica atende à exigência do art. 73, §10, da Lei das Eleições. Nesse sentido é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral.



Senão vejamos: ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER. CONDUTA VEDADA. DISTRIBUIÇÃO DE BENS. PROGRAMA SOCIAL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PROCEDÊNCIA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. 1. O Tribunal Regional Eleitoral assentou que houve a distribuição, em ano eleitoral, de diversos bens a eleitores carentes por meio de programa social não instituído por lei específica, caracterizando abuso de poder político e econômico. Diante das premissas que fundamentam o acórdão, não é possível novo enquadramento jurídico dos fatos. 2. Segundo a jurisprudência do TSE, somente a existência cumulativa da lei de criação do programa social e da previsão orçamentária específica atende à exigência do art. 73, § 10, da Lei das Eleições. Precedentes. 3. Decisão agravada mantida por seus fundamentos.



Agravo regimental desprovido. (Recurso Especial Eleitoral nº 172, Acórdão, Relator(a) Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 229, Data 02/12/2016, Página 46). (Grifamos) A conduta vedada imputada ao requerido deve ser analisada sob a ótica do abuso de poder, porquanto houve, em ano eleitoral, a distribuição sem amparo na lei de diversos bens e serviços a eleitores carentes maculando a normalidade e legitimidade do pleito. O requerido alega que os bens e produtos que foram doados por parceiros e não pelo Estado e que no ano de 2018 esses bens e produtos não foram ofertados, tendo sido somente prestados serviços pelo Estado. Ocorre que, conforme dispõe o art. 73, IV, da Lei n. 9.504/97, é proibido fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público.



Ressalte-se que segundo o doutrinador Zílio:, os atendimentos jurídicos e médicos, entrega de medicamentos e outros, se enquadram na vedação legal: “A expressão “serviços de caráter social” inclui a prestação de serviços médicos, jurídicos e odontológicos pelo Poder Público, ao passo que a “distribuição gratuita de bens” abrange a entrega de material de construção, escolar, medicamentos, vestuários e alimentos.”. Sabe-se que o bem jurídico tutelado pela norma que versa sobre as condutas vedadas é a isonomia, a igualdade entre os candidatos, que certamente foi maculada diante de ações de promoção pessoal, em diversos Municípios do Estado, ofertando bens e serviços tão escassos. O que se veda não é a distribuição dos bens e serviços à população, mas sim o desvirtuamento da sua finalidade estritamente assistencial. De acordo com o afirmado pelo requerido, o programa possui sítio eletrônico próprio a fim de dar a publicidade e transparência exigida na norma constitucional. No entanto, o mesmo poderia ter sido feito no próprio sítio eletrônico do Governo do Estado, da mesma forma como são feitos costumeiramente. O evento não passava despercebido. Na verdade, o que se quis foi usar do programa para fazer promoção política.





Rememora-se, ainda, que o próprio art. 73 da Lei das Eleições prescreve que são condutas vedadas porque "tendentes" a afetar a igualdade entre os candidatos, ou seja, presume-se que tais condutas, efetivamente, inclinam-se a desigualar os candidatos, sendo despicienda a prova da potencialidade da conduta na lisura do pleito.



Por todo o exposto, conclui-se que houve violação ao disposto no art. 73, § 10 da Lei nº 9.504/97, motivo pelo qual a Representação deve ser julgada procedente, inclusive com a incidência da multa prevista no § 4º do mesmo artigo de lei. III.



CONCLUSÃO Diante do exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, sem delongas, se manifesta pela PROCEDÊNCIA da representação para reconhecer a prática de conduta vedada, aplicando-se as sanções legais requeridas na exordial.



Cuiabá, 06 de agosto de 2018. 



CRISTINA NASCIMENTO DE MELO



Procuradora Regional Eleitoral

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